terça-feira, 24 de novembro de 2009

Mas não acho que sou muito gente...

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Ele: Santa Virgem, Macabéa, vamos mudar de assunto já!
Ela: Falar então de quê?
Ele: Por exemplo, de você.
Ela: Eu?!
Ele: Por que esse espanto? Você não é gente? Gente fala de gente.
Ela: Desculpe. Mas não acho que sou muito gente.
(Lispector, 1995)
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É que, pelos limites da reflexão sobre a existência, às vezes me esqueço de perceber que estou diante da própria percepção de concsiência. O limite do existir, se existo ou não. Espero eu, como uma epifania, o entendimento da minha real existência aqui. Talvez, quem sabe, despertar para o real. Mas não o meu real.
Sentir que posso falar de mim, sabendo que tenho condição humama para isso.

domingo, 22 de novembro de 2009

A torcida das cigarras

Todos os dias passo por um caminho cheio de árvores enormes e esbeltas. É lá que ouço o canto.
Essa época chuvosa, nublada e fria, nos traz muitas reflexões sobre a vida. O fim do ano vai chegando e a tristeza invadindo os pensamentos. Percebemos quantas coisas foram deixadas para trás, quantas coisas deixamos de lado e quantas coisas simplesmente nos deixaram. A semelhança dos sentimentos ao fim de cada ano é certa, mas nunca a esperamos. E mesmo assim, por incrível que pareça, esses sentimentos existenciais sempre nos surpreendem.
Quando me aventuro pelo corredor verde e vivo, as cigarras nos fazem agir, ou melhor, fazem o nosso pensamento agir. É confuso se não prestar atenção. Muita gente passa, reclama do barulho, resmunga e continua seguindo. Muita gente pára, olha, se pergunta por que tanta manifestação, mas vai embora. Muita gente não entende o que elas fazem. Mas nem tudo precisa, necessariamente, ser entendido. Ou entenda à sua maneira e aquilo se tornará uma verdade.
Se as cigarras morrem mesmo após o término do canto, é preciso ter esperança em alguma coisa, algo em que se agarrar até o suspiro final. A vida delas não têm história completa, não têm clímax, apenas um começo e um fim. Quando as pessoas passam, a chama que outrora jazia apagada, renasce e ascende sobre aquele exército de cigarras. A esperança ressurge na história vivida por cada pessoa. E quando elas passam, a torcida começa. Para cara uma que se aproxima, gritam seu canto, torcem por sua vitória. E o som vira um êxtase diante das árvores que servem de cenário para o espetáculo.
Mas os humanos, cheios de preconceito e ignorância, continuam seguindo, acreditando levar a vida indiferentemente, para toda a conformidade do mundo.
Se nós não vermos algo mágico naquilo que somos ou que poderíamos ser, se víssemos, estaremos sempre mais ligados à realidade sem graça das obrigações e deveres de todos os dias.
Quisera as pessoas saberem do real motivo de todo esse canto sufocado de desejo e magia...